Cem anos atrás, Iowa proibiu falar em público qualquer idioma que não fosse o inglês, uma medida que foi abolida, mas reflete um sentimento que ainda persiste nos EUA.
O então governador William Harding, firmou em 21 de maio de 1918 a denominada Proclamação Babel, que proibia o uso em público de qualquer idioma estrangeiro, incluindo em escolas, transportes públicos, por telefone ou mesmo o latim nas igrejas.
Em especial, a restrição era dirigida ao alemão, “o idioma do inimigo”, segundo a ordem executiva, em referência ao enfrentamento bélico que os Estados Unidos mantinham contra a Alemanha naquele momento, em plena Primeira Guerra Mundial.
Perante os protestos de que esta medida estaria violando a liberdade de expressão garantida pela Constituição, o Governador afirmou que esse direito se aplicaria apenas aos que falavam inglês.
“Tudo foi motivado por um sentimento de Harding contrário aos alemães” declarou o professor de inglês e linguística Dennis Baron, da Universidade de Illinois.
A proibição foi revogada dois anos depois, mas também incluiu os imigrantes holandeses e escandinavos que habitavam o estado. “Apesar de serem aliados na guerra, seus idiomas eram considerados similares ao alemão, e por tanto deveriam ser banidos para evitar que fossem utilizados em atividades de espionagem”, completa.
Na sua opinião, o sentimento contrário aos idiomas estrangeiro que motivou a proclamação resistiu ao tempo e “hoje se manifesta” nos incidentes de New York e Montana.
Em New York, um advogado se enfureceu porque os empregados de um restaurante falavam espanhol e os ameaçou em chamar a Imigração, enquanto na cidade de Havre (Montana), a 50 quilômetros da fronteira com o Canadá, um guarda da Patrulha de Fronteira reteve os cidadãos americanos que falavam espanhol por considerar “incomum”.
Estes eventos não são recentes, pois nos últimos anos foram registrados incidentes similares de pessoas que se queixam do uso do espanhol em comércios e lugares públicos.
Baron lembra que o inglês não é o idioma oficial dos Estados Unidos, um país onde são faladas mais de 350 línguas e que tem mais falantes de espanhol que Espanha e Colômbia, muitos dos quais (mais de 37 milhões em 2015, segundo dados do Pew Research Center) o utilizam diariamente em suas casas.
Jason Noble, professor e ex-presidente da Associação de Idiomas do Mundo de Iowa, disse que se sentia “triste” ao assistir vídeos dos incidentes em New York e Montana, pois é seu costume falar espanhol em público. “Agradeço, por nunca ter enfrentado uma situação onde alguém reagisse dessa maneira”, apontou. “Mas também me pergunto se não é porque sou um homem branco, de olhos azuis e com quase dois metros de altura”, acrescentou.
Noble, que estudou a Proclamação Babel, disse que Iowa sempre foi uma terra de múltiplos idiomas, desde os tempos dos índios algonquinos, exploradores franceses, comerciantes espanhóis e do fluxo de imigrantes suecos, noruegueses, dinamarqueses e alemães que chegaram aos EUA nos anos 1800.
“É interessante destacar que os tempos são outros”, disse Noble, ao destacar que a Governadora atual de Iowa, Kim Reynolds, assinou em no último dia 17 de abril uma lei que estabelece o Selo de Alfabetização Bilíngue, que reconhece estudantes de ensino médio que dominam o inglês e outro idioma, e a importância disso para o futuro.
Leia mais sobre a Revogação da Proclamação Babel (Revocation of Babel Proclamation, 1918).
Original: La obligación de hablar en inglés hace 100 años en Iowa resuena en el presente (em espanhol)