Já parou pra pensar se conseguiria se virar com seu idioma se fosse transportado mil anos no passado? Vamos imaginar: você acorda em algum lugar do mundo no ano 1025. A primeira coisa que faz é tentar falar com alguém… mas será que te entenderiam?
Imagine acordar no ano 1025. Tudo ao seu redor parece de outro mundo: construções, vestimentas, hábitos… e, claro, a linguagem. Você tenta falar, mas… será que alguém entenderia você? Adiantamos que, em muitos casos, provavelmente não!
Os idiomas mudaram tanto nos últimos mil anos que, em vários casos, um falante moderno teria dificuldade de se comunicar até mesmo em sua própria língua. Vamos ver por que isso acontece e o que estava acontecendo com os principais idiomas do mundo por volta do ano 1025.
Português
O português que falamos hoje, por exemplo, é bem diferente do que se falava no século XI. Se você falasse português moderno com alguém da Península Ibérica em 1025, provavelmente pareceria um viajante de outro mundo. A pessoa até poderia captar uma ou outra palavra… mas o todo soaria estranho, talvez incompreensível.
No século XI, o português ainda não existia como o conhecemos hoje. Era apenas uma das variantes regionais do galego-português, idioma falado no noroeste da Península Ibérica, fruto da evolução do latim vulgar. Era uma língua oral, usada entre camponeses e pequenos nobres, sem padronização. A escrita oficial era em latim. Só séculos depois, o português começaria a ganhar forma própria com documentos como o “Testamento de Afonso II” (1214) e a “Notícia de Fiadores” (1175), os primeiros registros escritos da nossa língua.
Espanhol
Também estava nascendo do latim vulgar. Em 1025, ainda se falava o que chamamos hoje de romance hispânico, com forte variação regional (castelhano, navarro-aragonês, leonês, etc). A presença árabe na Península Ibérica era fortíssima: mais de 700 anos de ocupação deixaram uma marca profunda no vocabulário e na cultura. Palavras como almohada, azúcar, aceite vêm dessa época.
Francês
O francês de hoje deriva do francês antigo (ancien français). Em 1025, falava-se uma forma bastante distante do francês moderno, com influências celtas, germânicas (francos), e, claro, do latim vulgar. Havia grande divisão entre os dialetos: o langue d’oïl no norte e o langue d’oc no sul. Não havia norma culta unificada: um parisiense provavelmente não entenderia bem alguém do sul da França.
Italiano
Na Itália, falava-se uma variedade enorme de dialetos regionais. O italiano moderno só ganharia forma com a literatura de Dante Alighieri (século XIV), que escolheu o dialeto toscano como base para sua Divina Comédia. Em 1025, porém, não existia “italiano”: havia apenas o latim como língua escrita, e o povo falava versões locais do latim corrompido, o chamado vulgar latino, com fortes características regionais.
Alemão
Em 1025, falava-se alto alemão antigo (Althochdeutsch), uma língua que pareceria completamente estranha para um falante de alemão moderno. Era falada no Sacro Império Romano-Germânico, mas, assim como em outros lugares, existiam muitos dialetos, e a comunicação entre regiões podia ser difícil. A padronização começaria apenas séculos mais tarde, com Lutero e sua tradução da Bíblia (século XVI).
Inglês
O inglês de 1025 era o chamado Old English (anglo-saxão). Era uma língua germânica, cheia de declinações, casos gramaticais e estrutura bem diferente do inglês atual. Um falante moderno não entenderia quase nada. Palavras como cyning (rei) e hūs (casa) mostram o quanto era diferente. O grande divisor de águas foi a conquista normanda de 1066, que trouxe massiva influência do francês e mudou drasticamente o vocabulário e a estrutura do inglês.
Norueguês
No século XI, o idioma falado na Noruega era uma forma de nórdico antigo (Old Norse), o mesmo idioma que era falado na Islândia e outras regiões escandinavas. Era uma língua riquíssima em flexões e com vocabulário bastante diferente do norueguês moderno. O norueguês atual começou a se formar após a união com a Dinamarca (1380), que influenciou muito a língua escrita.
Islandês
Curiosamente, o islandês moderno é um dos idiomas que menos mudou desde o nórdico antigo. Isso significa que um islandês de hoje, com certo treino, poderia ler as sagas escritas há mil anos e entendê-las, quase como nós lemos Camões com alguma dificuldade. A geografia isolada da Islândia ajudou a preservar sua forma arcaica. Portanto, o islandês permaneceu quase o mesmo, a comunicação seria bem possível.
Russo
Por volta de 1025, falava-se o eslavônico antigo, também conhecido como eslavônico eclesiástico, usado em textos religiosos. Nas ruas, os povos eslavos falavam línguas eslavas orientais primitivas. O alfabeto cirílico estava se consolidando após a cristianização da Rússia em 988. O russo moderno só começaria a ganhar forma com Pedro, o Grande, no século XVIII.
Turco
No século XI, os turcos ainda estavam migrando da Ásia Central para a Anatólia. Falavam o que hoje chamamos de turco antigo, com influências de línguas persas e árabes, principalmente após a islamização dos turcos seljúcidas. O turco moderno é muito diferente, especialmente após a reforma linguística promovida por Atatürk no século XX, que trocou o alfabeto árabe pelo latino e removeu muitos arabismos.
Árabe
O árabe clássico já estava consolidado como a língua do Alcorão desde o século VII. Em 1025, o árabe era a língua franca do conhecimento, ciência, filosofia e comércio no mundo islâmico. Universidades em Bagdá, Damasco e Córdoba eram centros de saber. Mas o que se falava no dia a dia não era o árabe clássico, e sim seus dialetos regionais, que, assim como hoje, variavam bastante de uma região para outra. Mas concluímos que sim, seria possível se comunicar.
Mas por que os idiomas mudam tanto?
Muita coisa influencia: guerras, migrações, invasões, trocas comerciais, religião, avanços tecnológicos… tudo isso vai deixando marcas na forma como as pessoas falam.
Além disso, até o próprio isolamento geográfico criava “versões” diferentes da mesma língua. Como não existia internet nem imprensa, o que se falava numa aldeia podia soar estranho numa cidade distante apenas 100 km.
Então ninguém sobreviveria com seu idioma antigo?
Não é bem assim! Um bom ouvinte, com tempo e disposição, conseguiria se adaptar. E há algo poderoso que ainda nos conecta: a linguagem corporal, os gestos, o tom da voz e a curiosidade humana.
E há também palavras que sobrevivem há séculos. Por exemplo, muitas palavras herdadas do latim ainda vivem no português, no espanhol e no francês. Elas são como fósseis linguísticos: vestígios de um tempo que ainda ecoam em nós.
Por isso, pensar se “você sobreviveria com seu idioma há mil anos” é mais do que uma curiosidade: é um lembrete de como somos moldados pelo tempo e pelo espaço.
Fontes: The Stories of English (Crystal, David), Language and History (Clackson, James), Empires of the Word (Ostler, Nicholas) e Manual de Dialectología Hispánica (Alvar, Manuel).
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