Ao ler o título de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”, de Júlio Verne, você pode se deparar com a versão original do livro, intitulada Le Tour du Monde en Quatre-Vingts Jours. Se você já se perguntou por que os falantes de francês precisam multiplicar quatro por vinte para formar oitenta, a resposta reside em uma característica única do francês: o sistema numérico vigesimal, que se baseia no número vinte.
Uma herança ancestral
A razão pela qual o francês usa “quatro-vintes” para se referir ao número 80 remonta a um sistema numérico muito antigo, utilizado pelos povos celtas e, mais especificamente, pelos gauleses. O sistema vigesimal é uma base de contagem que utiliza o número 20 como unidade. Isso se conecta diretamente às contagens primitivas feitas com os dedos das mãos e dos pés, já que os humanos têm 20 dedos no total. O uso de múltiplos de vinte para formar números como 80 e 90 reflete essa antiga prática de contagem.
No francês moderno, isso se manifesta da seguinte forma:
- 80 é dito como quatre-vingts (literalmente, “quatro-vintes”),
- 90 é dito como quatre-vingts-dix (ou “quatro-vintes e dez”).
Em algumas partes da Suíça, é comum usar a forma huitante para o número 80, que simplifica a contagem sem recorrer à multiplicação do número 20.
Da Gália à França
O sistema de numeração vigesimal no francês tem suas raízes na Gália, região habitada pelos gauleses antes da conquista romana. Com a chegada dos romanos e a adoção do latim, o francês moderno começou a se formar. No entanto, muitas influências das línguas celtas permaneceram, incluindo o peculiar sistema de contagem baseado no número 20.
Ao contrário do sistema decimal (base 10) que utilizamos hoje, o sistema vigesimal era uma característica fundamental das culturas celtas, como a dos gauleses. Isso reflete a importância dos dedos nas práticas de contagem e organização social dos povos antigos. A continuidade dessa tradição no francês moderno é um exemplo de como as línguas e os números podem preservar vestígios de antigas civilizações.
Da Babilônia ao cotidiano
Enquanto o sistema vigesimal é único para o francês e outros idiomas celtas, há outro sistema numérico igualmente antigo que moldou nosso cotidiano: o sistema sexagesimal de base 60. Esse sistema remonta à antiga Babilônia e ainda está presente em várias divisões do tempo moderno, como:
- O dia é dividido em 24 horas (duas vezes 12),
- Cada hora é subdividida em 60 minutos, e
- Cada minuto é subdividido em 60 segundos.
Esses vestígios do sistema babilônico influenciam não apenas a maneira como contamos o tempo, mas também como dividimos o espaço, como no círculo de 360 graus (60 x 6), um reflexo direto da base 60.
A influência céltica e a base 20
A base 20, ainda utilizada no francês, é uma característica importante de povos de origem celta, como os gauleses. No gaélico irlandês, por exemplo, também se observa uma base de 20 para a formação de números. Esses sistemas de contagem, profundamente ligados à cultura e à prática cotidiana das antigas civilizações celtas, se mantiveram em várias tradições linguísticas e culturais ao longo dos séculos.
Embora a base 10 tenha se tornado a norma mundial, em parte devido à sua simplicidade e à adaptação ao sistema decimal, a base 20 é uma prova da diversidade e riqueza dos sistemas numéricos antigos. O francês, portanto, mantém um elo com essas tradições, refletindo uma parte importante da história da humanidade.
Por que o francês “calcula” os números?
A curiosidade sobre o sistema de números em francês vai além da mera tradução ou conversão. Em vez de simplesmente dizer “oitenta”, como fazemos em português ou inglês, o francês “calcula” o número, multiplicando quatro vezes vinte para chegar ao total. Isso pode parecer estranho ou excessivo à primeira vista, mas essa forma de contagem reflete uma maneira profundamente enraizada de ver e organizar o mundo, herdada dos antigos gauleses e da contagem por base 20.
Essa característica do francês, de “calcular” os números em vez de simplesmente nomeá-los, é um exemplo da complexidade e da riqueza histórica por trás das palavras que usamos todos os dias. A língua, como um reflexo da cultura e das práticas antigas, mantém traços dessas tradições e continua a transmitir o legado de civilizações passadas.
O sistema numérico francês, com sua base 20, é um exemplo de como as antigas práticas de contagem ainda influenciam a língua e a cultura moderna. Embora o sistema decimal tenha se tornado o padrão global, o sistema vigesimal do francês nos lembra de uma era em que as diferentes civilizações adotaram sistemas de contagem variados, de acordo com suas próprias necessidades e visões de mundo.
Fonte: MegaCurioso
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