Palavras mutiladas, gramática incorreta no Whatsapp ou no Twitter, anglicismos por toda parte. Há anos, críticos e educadores reclamam que o idioma alemão está se empobrecendo. Será que estão certos?

“Difícil”, “perturbador”, “enfurecedor”: no tocante ao idioma alemão, o escritor americano Mark Twain (1835-1910) expressou suas opiniões sem rodeios. No ensaio de 1880 intitulado The awful German language (“A horrível língua alemã”), ele afirmava que uma pessoa talentosa poderia aprender inglês em 30 horas, francês em 30 dias, e alemão em 30 anos.

“Parece manifesto, então, que essa última língua deve ser abreviada e reparada. Caso permaneça como está, deve ser gentil e respeitosamente deixada de lado entre as línguas mortas, pois só os mortos têm tempo para aprendê-la.”

No ensaio e em sua subsequente palestra The horrors of the German language (“Os horrores da língua alemã”), Twain defendeu uma simplificação radical do idioma. Esse processo está bem encaminhado nos dias atuais – infelizmente, na opinião de muitos alemães.

Já em 2008, dois terços dos nativos acreditavam que seu idioma estava se deteriorando rapidamente. Comunicação online, leitura insuficiente, anglicismos e gírias juvenis foram algumas das razões apontadas como fatores contribuindo para esse declínio.

Em 2012, o então presidente do Conselho da Ortografia Alemã Hans Zehetmair afirmou que o declínio da língua estava ocorrendo principalmente entre as gerações mais jovens, que geralmente usam vocabulário simples em mensagens de texto e postagens na internet: “O alemão está sendo reduzido a uma ‘língua reciclada’ nas novas mídias. É cada vez mais abreviado e simplificado e reformulado sem nenhuma criatividade.”

Idioma em movimento

De acordo com Andrea-Eva Ewels, a realidade não é tão extrema assim. Ela é a diretora da Associação para o Idioma Alemão (GfdS), uma das mais importantes instituições linguísticas patrocinadas pelo governo federal. “Não, nossa língua não está desaparecendo. Está apenas mudando constantemente, em parte porque o mundo está mudando de forma mais rápida e extensiva do que nunca”, disse em entrevista à DW. “Hoje, por exemplo, não falamos mais como no século 6º ou na Idade Média.”

Ewels acredita que a língua precisa se adaptar constantemente às novas circunstâncias cotidianas, para servir como um método de reflexão e comunicação. Por isso, ela não acha que Whatsapp ou Twitter estejam deformando o idioma alemão, como se costuma dizer, pois não há nada de novo em usar gramática simplificada e espaços limitados para apresentar mensagens abrangentes, e cita restrições semelhantes nos telegramas.

A especialista afirma que, do ponto de vista linguístico, tampouco há provas de que o modo de as gerações mais jovens empregarem o idioma contribua para sua deterioração: “Os jovens sempre tiveram sua própria linguagem, que usam entre si, e que é muito criativa, espontânea, direta e flexível. Eles veem seu estilo de linguagem como uma maneira de se diferenciar dos adultos e um espaço para inovação e uso mais relaxado do idioma.”

Embora educadores venham soando o alarme quanto ao conhecimento insuficiente de ortografia e gramática entre escolares e universitários, Ewels assegura não ser nada de novo, sua associação recebe há décadas reclamações de professores. Para ela, a negligência com a gramática alemã – como o uso correto dos quatro casos, nominativo, acusativo, dativo e genitivo – é parte de uma evolução natural.

“A transformação de um idioma sempre leva à simplificação de sua estrutura. As funções gramaticais que se fundiram com outras funções existentes e, portanto, se tornam supérfluas, desaparecem lentamente do uso cotidiano.”

Adulteração metódica

A Alemanha possui uma longa tradição de lamentar a decadência de seu idioma. Em 1721, a princesa alemã Elisabeth Charlotte do Palatinado, cunhada do francês Luís 14, questionava num carta a uma amiga se os alemães haviam ficado tolos a ponto de deixar seu idioma se deteriorar, ficando impossível de entender.

Em 1852, o filósofo Arthur Schopenhauer reclamava da “adulteração metodicamente impulsionada”, afirmando que “esses incompetentes devem soltar sua estupidez sobre algo que não seja o idioma alemão”.

Em séculos passados também era comum o alvoroço contra palavras estrangeiras. Em 1617, época em que o francês era falado nos círculos sociais mais altos da Europa, nobres alemães fundaram a Fruchtbringende Gesellschaft (“Sociedade Frutífera”), que tinha como um de seus principais objetivos manter o alto-alemão livre de “interferências de palavras estranhas e estrangeiras”.

Puristas idiomáticos contra anglicismos

Pouco mais de 400 anos depois, as associações de puristas linguísticos têm esse mesmo objetivo. Elas se opõem veementemente aos anglicismos e reivindicam maior lealdade à língua alemã, inclusive com sua inclusão na Constituição como idioma oficial do país.

Tais posicionamento e reivindicações constitucionais que fazem gente como a diretora da Associação para o Idioma Alemão balançar a cabeça. “Levamos a sério as queixas, mas vemos palavras estrangeiras que não têm um equivalente em alemão como um enriquecimento da nossa língua”, explica Ewels.

Ela argumenta que, embora o inglês seja cada vez mais importante na Alemanha, por sua posição como língua franca global, a suposta ameaça que ele representa ao entrar em contato com o alemão é comparável à discrepância entre a temperatura atmosférica cientificamente mensurável e a assim chamada sensação térmica.

Ewels frisa que, estatisticamente, uma em cada três a cinco palavras do alemão veio de uma língua estrangeira, com raízes no grego e no latim. Apenas 1% a 2% dos vocábulos são baseados em termos ingleses. De fato, o anglicismo mais usado é “okay”. E, de acordo com um estudo de 2016 do instituto de pesquisas de opinião YouGov, o termo é usado com frequência por 90% dos que afirmam rejeitar anglicismos.


Via DW

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